3 de maio de 2017

Noticia: Lava Jato: ‘Incoerente’, diz Dallagnol sobre STF libertar Dirceu da cadeia

Ex-ministro foi libertado por 3 votos a 2 no Supremo, nesta terça-feira (2). Para coordenador da força-tarefa do MPF na Lava Jato, embora os cidadãos depositem sua esperança no STF, elas “foram frustradas

Coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal na Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol afirmou que a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de soltar o ex-ministro José Dirceu é “incoerente”. Confira todo o seu comentário mais abaixo.

Como procedeu o STF

Por três votos a dois, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira (2), revogar a prisão preventiva do ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu (PT), homem forte do governo Lula. No julgamento de um habeas corpus em favor do petista, José Antonio Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes afirmaram que agora cabe ao juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, estabelecer medidas cautelares contra o ex-ministro, como ordens para que fique em prisão domiciliar, que seja obrigado a comparecer periodicamente à justiça, que não entre em contato com outros investigados no processo ou que use tornozeleira eletrônica.

Dirceu foi preso em 3 de agosto de 2015, nove meses após ter deixado o presídio da Papuda para cumprir prisão domiciliar no escândalo do mensalão. Alvo principal da 17ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Pixuleco em referência ao nome usado por petistas para se referir a propina – o ex-ministro já foi condenado a mais de 31 anos de prisão pelo juiz Sergio Moro por crimes como corrupção passiva, lavagem de dinheiro e pertinência da organização criminosa.

No julgamento, a maioria dos ministros seguiu entendimento do ministro José Antonio Dias Toffoli, que afirmou que não seria possível manter a prisão preventiva de Dirceu apenas com base em uma condenação de 1ª instância, feita pelo juiz Moro. Em seu voto, Toffoli disse que medidas menos lesivas, diferentes da carceragem de Curitiba, poderiam ser aplicadas no caso de Dirceu. “Subsiste o periculum libertatis [perigo de se colocar o acusado em liberdade], mas ele pode ser obviado com as medidas cautelares, diversas e menos gravosas que a prisão, o que irá repercutir no direito de liberdade do réu”, disse.

O ministro questionou o critério de “atualidade” da prisão de Dirceu, uma vez que os fatos investigados ocorreram no passado e os temas que ensejaram a interpretação do risco de reiteração delitiva não existem mais. O magistrado disse que manter Dirceu atrás das grades significaria uma “punição antecipada”, já que ele ainda pode recorrer ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, segunda instância dos processos relacionados à Lava-Jato. “O risco de reiteração [do crime] é remotíssimo. Não se pode impor ao paciente que aguarde preso indefinidamente eventual condenação no segundo grau de jurisdição”, declarou o ministro Ricardo Lewandowski.

“Estaríamos a impor prisão perpétua para que pessoas não voltassem a delinquir”, ironizou Toffoli. “O princípio da presunção da inocência está na nossa Constituição”, completou ele. Crítico contumaz do que classifica como “excessos” de Curitiba, o ministro Gilmar Mendes resumiu: “há um excesso temporal na prisão preventiva. Não estamos censurando o decreto de prisão, mas estamos dizendo que aqui o decreto que inicialmente poderia ser legal ou constitucional se inconstitucionalizou”. “Não podemos nos ater à aparente vilania dos indivíduos para decidir a prisão processual. Nós, às vezes, temos que atuar contramajoritariamente num sentido, até para proteger essas pessoas contra seus próprios instintos”, justificou Mendes ao revogar a prisão preventiva de José Dirceu.

Em seu voto, o relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin, que nos últimos julgamentos tem defendido as prisões, mas saído derrotado, afirmou que as prisões preventivas não poder ser “um fim em si mesmo”, mas declarou que são defensáveis e legítimas quando um preso como Dirceu pertence a uma organização criminosa e, quando, se colocado em liberdade, pode representar risco à sociedade. Ainda que Dirceu esteja preso desde agosto de 2015, Fachin afirmou que “eventual excesso na duração das prisões cautelares não deve se acautelado mediante prazos estanques”. Ele lembrou que o juiz Sergio Moro, que condenou Dirceu, avaliou haver “boa materialidade de crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro”. Ao considerar que a prisão de José Dirceu não representa um “constrangimento ilegal”, Fachin citou ainda que a prisão do petista, na avaliação de Moro, está relacionada à gravidade em concreto de ele ser colocado em liberdade e à necessidade de prevenir prática de novos crimes.

Como tem sido recorrente em julgamentos de políticos, o decano Celso de Mello fez um duro discurso contra a corrupção e votou por manter a prisão preventiva de José Dirceu. “Este caso revela um dado absolutamente impressionante e profunda inquietante, porque o que parece resultar dos elementos de informação coligidos é que a corrupção impregnou-se profundamente no tecido e na intimidade de algumas agremiações partidárias e instituições estatais, transformando-se em método de atuação”, disse. Mello disse não haver “excesso irrazoável” na prisão preventiva de Dirceu e nem ilegalidade em manter o petista detido em Curitiba. “Com a instauração deste e de quaisquer outros procedimentos de persecução penal, não se está a incriminar a atividade política, mas a promover a responsabilização penal daqueles que não se mostraram capazes de exercer a atividade política com honestidade, preferindo transgredir”, completou.

Nos últimos dias, a defesa de José Dirceu contava com a possibilidade de o petista ser colocado em liberdade após a sinalização da 2ª Turma de que a manutenção das prisões de condenados em 1ª instância por Moro poderia significar uma antecipação de pena. Conforme revelou ‘Veja’, a concessão de liberdade ao pecuarista José Carlos Bumlai e ao ex-tesoureiro do PP João Claudio Genu representou uma significativa derrota ao juiz Sergio Moro e à força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.

Desabafo

Em publicação nas redes sociais, o procurador Deltan Dallagnol disse que “chama a atenção” que os mesmos ministros que decidiram pela saída de Dirceu da prisão – Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski – “votaram para manter presas pessoas em situação de menor gravidade, nos últimos seis meses”.

O procurador citou três casos: o de um ex-prefeito do Piauí acusado de corrupção “em menor vulto e por menos tempo” que Dirceu, o de um acusado por tráfico preso com “162 gramas de cocaína e 10 gramas de maconha” e o de um réu primário, “encontrado com menos de 150 gramas de cocaína e maconha”.

Em cada um dos casos, ele citou decisão de um dos ministros. Em seguida, fez uma “conclusão”: “Diz-se que o tráfico de drogas gera mortes indiretas. Ora, a corrupção também”, disse Dallagnol.

“A mudança do cenário, dos morros para gabinetes requintados, não muda a realidade sangrenta da corrupção. Gostaria de poder entender o tratamento diferenciado que recebeu José Dirceu, quando comparado aos casos acima.”

O procurador ainda afirmou que, embora os cidadãos depositem sua esperança no STF, elas “foram frustradas”.

Segundo ele, “fica um receio” porque estão presos desde 2015 o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, os ex-diretores da Petrobras Renato Duque e Jorge Zelada, Marcelo Odebrecht, o ex-presidente do PP Pedro Correa e os ex-deputados André Vargas (ex-PT-PR) e Luiz Argôlo (ex-SD-BA).

“Todos há mais tempo do que José Dirceu. Isso porque sua liberdade representa um risco real à sociedade. A prisão é um remédio amargo, mas necessário, para proteger a sociedade contra o risco de recidiva, ou mesmo avanço, da perigosa doença exposta pela Lava Jato”, disse o procurador.
Fonte: Veja e Notícias ao Minuto



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