A palavra incrivelmente dura de João Batista, 3.1-12 (Mc 1.2-8; Lc 3.1-18; Jo 1.15,19ss)
1,2 Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto da Judéia e dizia: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus.
Apesar de João Batista ser apresentado ao leitor pela primeira vez, Mateus não informa nada acerca de sua origem. João é denominado expressamente o “batista”. O cognome não se pode encontrar em parte alguma do AT. No AT fala-se de João como “anjo”, o que “prepara o caminho”, o que “clama alto” e expressões semelhantes, mas não de João como o “batista”. Este segundo nome ele recebe somente no NT, e isso constantemente.
O que significa para João o batismo, do qual, como vimos, recebeu o cognome “o batista”? No tempo de João os judeus já conheciam, ao lado de vários tipos de batismos (no sentido de lavagens e banhos religiosos), um batismo único. Entretanto, esse batismo total executado uma única vez não era um batismo para os próprios judeus, mas sim para os pagãos que queriam passar para o judaísmo.
Esse batismo único para os gentios significava um afastamento radical de todo o passado pagão e a decidida condenação do mesmo.
Se, a partir dessa observação, nos aproximamos do nome “o batista”, a palavra “batista” adquire vida e cor. Ao exigir o repúdio radical de todo o passado, o qual deveria evidenciar-se no batismo, expressa-se que o batizando tinha de dizer um decidido “não” à sua vida anterior e a suas tradições e costumes religiosos.
Como arauto do rei vindouro e de seu reino, João Batista considerava um tal batismo total como a única mas necessária condição para o ingresso no “reino dos céus”. Defendia-o a partir da convicção de que o atual povo de Israel tornou-se um acampamento de impuros, sim, é preciso dizer, um redil de pagãos.
Essa era uma pregação inaudita e terrivelmente dura de João.
Ao exigir o batismo, portanto, João colocava o Israel inteiro no mesmo nível dos pagãos indignos, que, na verdade, eram tidos pelos judeus como a escória da humanidade, miserável ralé de criminosos, como assassinos e devassos. Agora compreendemos bem o significado revolucionário e provocante do batismo de João. É por isso que se cunhou o termo fixo “João Batista”. Sabia-se muito bem o que estava contido nele.
Acrescentava-se ainda o seguinte: O local de pregação desse batizador não era o templo, com seu culto ricamente elaborado, equipado com todos aqueles meios disponíveis de expiação, válidos desde os tempos dos patriarcas, prescritos em todos os detalhes… Não, o templo não era o local de pregação do Batista, e sim o deserto e os lugares ermos. Porque também isso era tão impressionante e revolucionário, a expressão “no deserto” é usada logo duas vezes (v. 1 e 3).
O que significava, afinal, o deserto no AT? O deserto é a terra do diabo, o local do terror e dos sobressaltos. De acordo com Lv 16.7-10, costumava-se, no dia da reconciliação, enviar um bode para o deserto, para ser destinado a Asasel. Com isso se mostrava que o pecado tinha s ido levado ao lugar do terror, ao lugar do diabo.
Esse lugar de terror é, agora, o local de pregação de João Batista. Sim, é para lá, ao deserto, que o povo devia ir, para deixar os pecados lá fora.
Junto com o seu batismo o Batista “anuncia”, em segundo lugar, a palavra da “conversão”. De propósito não usamos o termo “arrependei-vos” (fazei penitência), mas em vez dela “dai meia volta”, “convertei-vos”. Essa palavra é bem conhecida no AT e no judaísmo de então. Traduzir o chamado de João e de Jesus com “fazei penitência” expressa de modo insuficiente aquilo que João e Jesus queriam, porque a penitência está marcada pelo sentido de penitenciar-se, expiar, reparar o erro. O chamado do Batista e de Jesus, porém, dirige fixamente o olhar para a conversão radical. Em todo AT não existe o conceito do arrependimento no sentido de pagar, expiar e reparar o pecado. Sempre é usado: “dar meia volta, renunciar”. São esses termos que deveriam ser usados, pois no NT a situação é a mesma. Em sua grande obra científica Die Umkehr, Bekehrung und Busse im AT… (Stuttgart, 1936, 460 p.), E. K. Dietrich escreve: “Não vejo uma razão científica para manter a tradução “fazei penitência”. – Sobre isso pode-se comparar também as afirmações de Schlatter, Feine, Pohlmann, Eckstein e outros. Também Schniewind opina que “a palavra „penitência‟ está sobrecarregada com ideias que levam exatamente para longe daquilo que a Bíblia fala sobre metánoia (a palavra grega para conversão). Todas as idéias de redimir-se, fazer reparação, encobrem o que é a metánoia bíblica”. Mais detalhes e aprofundamento em Rienecker: Begrifflicher Schlüssel zum griechischen NT. – No idioma alemão a penitência (Busse) tem ligação com bass, besser (= tornar-se melhor). Significa, como já expusemos, a “reparação de um dano”, pagamento ou substituição de um prejuízo. O acento está no “esforço, produção de uma substituição, satisfação”, a qual eu tenho que realizar.
Conforme já informamos, a palavra grega no NT para “conversão” é metánoia. O que significa essa palavra no grego secular? Indica a mudança do pensamento, precisamente no sentido de que intelectualmente mudei minha opinião sobre um ou outro assunto. No NT a palavra metánoia, por sua vez, não significa mudar a opinião sobre algo qualquer (talvez sobre algumas coisas), mas estende-se sobre a opinião toda e o pensamento todo da pessoa. A totalidade do pensamento e da atitude precisa mudar! No contexto secular essa palavra jamais foi usada com esse sentido.
A palavra metánoia, provida de novo e profundo sentido, constitui-se num dos conceitos principais do NT, sim, ela faz parte do que é mais essencial na própria fé cristã. A metánoia (= meia-volta, conversão) do NT considera a totalidade do pensar, sentir e querer do passado como inteiramente errado, como “longe de Deus”, até mesmo como sendo contrário a Deus! Portanto, conversão é a mudança de todo o pensar, sentir, querer e agir. Deus quer uma nova vida, não apenas uma nova mentalidade! Se a atitude geral anterior da pessoa foi uma conduta religiosa ou não, isso não anula a necessidade e incondicionalidade da exigência da conversão! Efetivamente, tal conversão radical e total permanece sendo a única premissa para entrar no “reino dos céus”.
Para darmos uma breve resposta à pergunta: A conversão é ato de Deus ou da pessoa?, citemos o seguinte aspecto: A pessoa não pode converter-se a si própria, mas pode deixar-se converter! – Nosso sim a ele, a nosso Senhor, origina-se unicamente do sim de Deus por nós. Nosso não, porém, é unicamente a nossa culpa!
Usando uma ilustração: Quando se joga uma bóia salva-vidas a uma pessoa que está se afogando e ela a segura, e de fato a agarra firmemente com toda a sua energia – a pessoa assim resgatada não pode dizer: Eu me salvei, mas terá de dizer: Eu fui resgatada. Da mesma forma, a pessoa salva terá de reconhecer: Se eu não tivesse agarrado com toda a seriedade aquela bóia, eu sozinho seria culpado da minha morte nas ondas.
Assim, ter sido salvo é um presente.
Afogar-se, porém, é culpa!
Conversão não é produto do esforço, mas dádiva!
Perder-se, no entanto, é culpa, culpa própria, cem por cento!
“Conversão é a premissa incondicional do novo tempo que irrompe, o reino dos céus.” Convocando com essas palavras em alta voz para a conversão, João reitera pela última vez, antes que venha o próprio Senhor, a exigência fundamental dos profetas do AT!
Mateus diz “reino dos céus”, num total de 37 vezes. É somente Mateus que usa essa expressão. Marcos e Lucas trazem “reino de Deus”. Essa última forma é usada por Mateus somente 5 vezes. Tecnicamente não há diferença entre uma expressão e outra. Por reverência, Mateus evita o nome “Deus”, motivo pelo qual não diz “reino de Deus” mas “reino dos céus”! Em lugar de “reino dos céus” talvez se poderia traduzir melhor com “governo dos céus”. Pois não se pensa em primeiro lugar num “reino”, no sentido de um espaço ou lugar, mas num reino no sentido de uma ordem vigente, uma ordem em que somente Deus tem o comando como um rei, e a cujo comando e governo a gente se submete sem restrições. É esse “governo de Deus”, o qual um dia será revelado total e plenamente com glória na nova terra, que João está anunciando e que já iniciou em Jesus e terá continuidade na comunidade de Jesus até os confins da terra.
3 Porque este é o referido por intermédio do profeta Isaías: Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas.
João tem de consertar o caminho. Naquela época, quando não havia rodovias “asfaltadas”, preparava-se um caminho para o rei que anunciava sua chegada. Essa preparação do caminho sempre se constituía num trabalho árduo. A figura da preparação do caminho é aplicada à atividade de João. O “preparador do caminho” é João Batista. Preparar o caminho requer o empenho da pessoa toda.
4 Usava João vestes de pêlos de camelo e um cinto de couro; a sua alimentação eram gafanhotos e mel silvestre.
Aí estava, pois, esse João, lá fora no deserto. Não precisava de nada daquilo que os outros precisavam. Sua vestimenta era somente o pelo de um camelo, talvez de um camelo que pereceu no deserto. Tal vestimenta constituía uma flagrante ofensa às leis de pureza dos judeus. Gafanhotos eram seu alimento. Também essa alimentação contrariava os costumes da vida normal em Israel.
Tudo, “palavra e pessoa”, “pregação e vivência” formavam um único sinal que incitava à conversão!
5,6 Então, saíam a ter com ele Jerusalém, toda a Judéia e toda a circunvizinhança do Jordão; e eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados.
Qual foi, porém, o resultado da instigante mensagem de conversão? Foi raiva, ódio e revolta? Não! Saíam a ter com ele Jerusalém, toda a Judéia… Eles se dirigiam até ele. João não precisava correr atrás deles. Não tinha dificuldades para trazê-los à palavra de Deus. Todo o acontecimento no rio Jordão transformou-se, pela pregação do Batista e pelo seu batismo, num singular movimento divino. Não havia como agir diferente. As pessoas eram impelidas até ele no deserto.
7-9 Vendo ele, porém, que muitos fariseus e saduceus vinham ao batismo, disse-lhes: Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da ira vindoura? Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento; e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão.
Não apenas pela singularidade de seu batismo total e pela exigência da conversão, mas também com as marteladas do restante de sua pregação, João destroça todas as proteções e seguranças dos fariseus e saduceus diante dos seus próprios olhos. João chama os fariseus e saduceus de “ninhada e serpentes”, “semente de cobra”, “antro de víboras”. – “Semente de víboras é o que são vocês”, diz ele, “e não o que presumem, semente de Abraão”!
Para cada israelita essa expressão é, mais uma vez, uma palavra arrasadora. Pois “velha serpente” significa: “pai da mentira”, e a semente da velha serpent e é, de acordo com a antiqüíssima palavra de Deus, o poder inimigo das profundezas, contra o qual a espécie humana tem de lutar, por questão de vida ou morte. “Esse veneno de serpente assassina tornou-se agora pessoal”, diz João, “e esse veneno de víboras em pessoa são vocês fariseus e saduceus, aos quais estou falando. O que vocês possuem da semente de Abraão foi transformado no seu contrário, por isso vocês não têm nenhuma
participação na semente de Abraão, porém a mais antiga maldição de Deus paira també m sobre as
cabeças de vocês!”
Como causa mais profunda da perversão de seu pensamento João considera que, seguros de si, confiavam na sua ligação natural com Abraão. Construíam com toda a certeza sobre tudo o que torna essa ligação natural exteriormente perceptível: a circuncisão, o sábado, a letra do templo e da lei. Pensavam que era essa a religiosidade completa e agradável a Deus.
João, agora, arrebenta radicalmente todas essas seguranças e apoios. De fato, arrasa tudo o que tinham! (cf. opr para Mt 5.20 e o sermão do Monte).
Ao proferir essa pregação de condenação, não está João arrasando também a própria promessa que Deus fez a Abraão? Não: quando os fariseus e saduceus se afastarem substancialmente de sua religiosidade impostora e presunçosa, poderão ser inseridos na verdadeira e essencial descendência de Abraão. Isso é possível unicamente através de uma conversão fundamental, e nada mais.
Assim como os fariseus se refugiavam junto de seu pai Abraão, da sua justiça, a qual requeriam vicariamente para si próprios, assim o cristão hoje, sempre de novo, corre o perigo de basear-se na bênção concedida aos pais. Acredita-se que, como aquilo que os pais realizaram sob a bênção ainda permanece, a bênção de Deus ainda paire sobre os descendentes. Acredita-se que, por causa dos pais, Deus também se comprometeria com os de hoje.
Sem dúvida João aderiu sem restrições à promessa feita a Abraão. Pela Escritura, João sabia que os filhos de Abraão são herdeiros do reino. – Contudo, o Batista combateu com o máximo vigor a opinião dos judeus de que Deus estivesse atrelado a Israel, que para Deus Israel seria imprescindível.
De modo algum Deus está amarrado a Israel. Com sua onipotência divina ele pode, em um momento, formar para si filhos de Abraão, até mesmo de pedras “mortas”.
Deus não precisa de nós. De jeito algum somos imprescindíveis. Deus pode passar por nós diretamente ao que lhe interessa. Ele age como ele quer, não como nós queremos! Também hoje e agora ele pode acordar para a vida e colocar no seu serviço pessoas que estão totalmente afastadas dele (“pedras mortas”)!
10 Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo.
Depois da palavra sobre os “filhos de Abraão”, João traz o discurso sobre a “árvore que não traz bons frutos”. Os ouvintes do Batista sabem que essa metáfora da árvore foi tirada do Sl 1. Os fariseus têm a firme convicção de que se assemelham à árvore plantada junto à corrente de águas, que, no devido tempo, dá o seu fruto. Por isso pensam que tudo o que fazem é correto. O Batista lhes afirma exatamente o contrário, ou seja, que eles se assemelham à árvore infrutífera, que é cortada e lançada ao fogo.
A palavra do fogo encerra pela primeira vez um trecho da pregação do Batista. Ainda ouviremos a palavra “fogo” duas vezes.
11 Eu vos batizo com água, para arrependimento (conversão); mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do que eu, cujas sandálias não sou digno de levar. Ele vos batizará com o
Espírito Santo e com fogo.
Todos os quatro evangelistas trazem a palavra do batismo com água, do batismo total. Diferente de Marcos, Mateus interpreta o batismo na água como exigência, cujo alvo é a conversão. Eu batizo vocês em direção da conversão ou para dentro da conversão. De acordo com Mateus, o Batista batiza para que se deixem os pecados, para que se viva em obediência a Deus na nova vida do reinado dos céus.
Marcos fala de um batismo cuja premissa é a conversão. Em Mc 1.4 lê-se: “João prega o batismo de conversão para remissão de pecados”. Ou seja, para Marcos o batismo da água é um batismo que tem como premissa e condição a conversão. Somente quem é “convertido”, quem “deu meia volta” é que recebe o batismo. Portanto, primeiro a conversão, depois o batismo.
Porém Mateus e Marcos não estão divergindo um do noutro na compreensão do batismo. Ambos estão corretos na transmissão das palavras do Batista. A vida cristã tem a meia volta (conversão) como premissa e também como alvo (santificação). É decisivo que quem vem da conversão persevere nela. Uma vida assim moldada pela meia volta teve como conseqüência o perdão dos pecados como dádiva e experiência únicas e o experimenta sempre de novo, diariamente, como presente e descoberta.
Em outras palavras: Não é biblicamente correto dizer que é preciso converter-se diariamente, que a conversão seria um ato de fé a ser repetido sempre de novo. Não! A visão bíblica é mais precisamente esta: Desde a conversão com que Deus o presenteou, o convertido vive num novo estado, numa nova atitude. Essa atitude, essa posição de fé, esse estar fundamentado na fé precisa mostrar-se sempre de novo, precisa evidenciar-se continuamente em ações de fé. O fato fundamental do novo nascimento precisa deixar que a palavra de Deus se explicite. Ou, inversamente: A nova vida precisa evidenciar a conversão. É nisso que se revela o ser mergulhado no Espírito Santo, o batismo com o Espírito Santo. A nova vida é estar constantemente rodeado pelo Espírito Santo, é estar cheio dele! O Espírito e o fogo são o elemento da nova vida que continuamente julga e purifica, como também continuamente aquece e promove a vida. Assim é que deve ser entendida a palavra: “Ele vos batizará com o Espirito Santo e com fogo”.
Para finalizar, repetimos mais uma vez: A conversão não é um acontecimento contínuo que se renova de caso em caso, de ação de fé em ação de fé. No entanto, a conversão efetua primeiramente a atitude de fé, o estado de fé, a partir do qual emanam os diversos atos de fé, nos quais, por sua vez, se confirma cont inuamente a atitude de fé anteriormente produzida.
Na linguagem teológica essa verdade foi expressa na seqüência habitu fidei, actu fidei (atitude de fé, ato de fé).
Após declarar a palavra do batismo com água (batismo total), João chega à afirmação sobre aquele “que vem depois de mim”, ou “que vem atrás”. É uma palavra que se encontra em todos os quatro evangelistas. O que vem atrás, porém, é ao mesmo tempo o “mais forte”. O dito do mais forte aparece literalmente em 3 evangelistas. Que consolo para João foi saber: vem após mim alguém que é mais forte que eu. O que seria da obra da vida dele sem o fato de que alguém vem depois dele? Seria em vão! E o que seria do nosso trabalho diário e da vida toda, se não viesse alguém atrás de nós e o segurasse nas mãos?
A palavra do “que vem atrás”, do “mais forte” é ampliada pela figura do “escravo doméstico” que serve ao seu amo que chega, retirando-lhe as sandálias e “levando-as embora”. Essas sandálias o patrão usava somente na rua – não na casa. O serviço de levar embora as sandálias é o mais humilde e mais fácil trabalho de um escravo.
Enquanto Mateus fala do serviço de escravo de levar embora as sandálias, Marcos, Lucas e João usam a figura de soltar as sandálias. Como tudo é bem ilustrado! Antes de levar embora as sandálias é necessário desatar as suas correias. Nem sequer para isso o Batista se considera digno (mais explicações nos comentários sobre os outros evangelistas). Ele sabe que não é capaz de realizar a mínima coisa que significasse qualquer tipo de ajuda para o “mais forte”. Diante daquele “que vem” ele não é nada. Ao lado de Cristo o Batista desaparece totalmente. O Batista sente somente sua impotência diante da plenipotência do Cristo!
Esse é João no deserto, aquele que prepara o caminho, que grita alto, que batiza para a conversão, que como tal prepara o caminho, como escravo e batizador com água, para aquele que vem atrás dele, o mais forte, que “batiza com o Espírito Santo”.
12 A sua pá, ele a tem na mão e limpará completamente a sua eira; recolherá o seu trigo no celeiro, mas queimará a palha em fogo inextinguível.
Novamente João emprega a palavra “fogo”, agora pela terceira vez (v. 10-12, sempre no final). Os fariseus acreditavam que eles faziam parte do trigo que seria recolhido ao depósito. Mais uma vez precisam ouvir justamente o contrário, que por serem palha serão queimados com fogo inextinguível.
Como é dura também essa sentença! Numa olhada panorâmica sobre toda a pregação do Batista, perguntamo-nos instintivamente: Será que não foi realmente pesado demais o que o Batista disse?
Será que uma tal palavra de condenação não provocará o contrário do que intencionava? Os fariseus e saduceus não se rebelarão numa ira feroz?
Schlatter afirma sobre este trecho: “Desejar o batismo e permanecer ao mesmo tempo fariseu ou saduceu, isso provoca a perdição definitiva e inevitável”. A palavra arrasadora de Jesus em Mt 12.31-34 e os oito ais do Senhor contra os fariseus em Mt 23.13-33 mostram-nos que o julgamento da obstinação é terrivelmente sério.
Acaso não há sempre o perigo de experimentar a conversão e, não obstante, permanecer fariseu, isto é, agarrar-se ao que era antes, próprio da gente, e não levar integralmente a sério o novo? Não ocorre muitas vezes que, após a conversão, adota-se muitas palavras piedosas, passa-se a falar com fluência um linguajar existente de fé, orar e ler a Palavra de Deus se tornam atividade religiosa? E que, apesar de toda essa ocupação religiosa, a substância interior do eu continua sendo a mesma, deixando existir bem no fundo, quase igual como antes, a pessoa orgulhosa, inflexível, melindrosa, teimosa e insensível, que de bom grado inclina seu ouvido ao elogio, à bajulação, mas o fecha para a verdade, a necessidade de um corretivo?! Conversão autêntica tem consequências, consequências imprevisíveis, para a existência própria e também para a vindoura; ela traz fruto, ela gera vida borbulhante em santidade e justiça! Cf. Mt 5–7.
Fonte: Mateus - Comentário Esperança
Nenhum comentário:
Postar um comentário