Em Malawi, uma das dezenas de países afetados pela estiagem, Meleniya Mateyu diz que precisa sair em busca de raízes de plantas aquáticas chamadas nyika em córregos e pântanos para alimentar seus dois netos órfãos.
A pequena quantidade de grãos que ela consegue com uma agência de ajuda humanitária mal dá para uma refeição por dia.
“Estamos sobrevivendo à base de nyika”, disse Mateyu, em entrevista, em sua aldeia, no distrito de Chikwawa, a cerca de 50 quilômetros ao sul da capital, Blantyre. “A fome deste ano é a pior que eu vi nos últimos 10 anos”.
A seca -- um sintoma do fenômeno climático global El Niño -- está reduzindo a produção de grãos no sul e no leste da África e aumentando o risco de ampliar a fome para algumas das populações mais pobres do mundo.
Dos 34 países que exigirão auxílio alimentar neste ano, 27 estão no continente, mostram dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). E as necessidades crescem em um momento em que o restante do planeta desfruta da abundância de grãos e de custos cada vez menores para os alimentos.
Situação difícil
A situação pode ser a pior registrada desde a última grande crise de alimentos da África, em 2002-2003. Um total de 28 milhões de pessoas já encara a fome, segundo números de janeiro fornecidos pela agência de assuntos humanitários da ONU.
O Programa Alimentar Mundial diz que até 50 milhões de pessoas poderão acabar sendo afetadas na região. Outras 10 milhões de pessoas estão em risco na Etiópia por causa da seca e outros milhões em países em conflito, como o Sudão do Sul e a República Centro-Africana.
Embora a ONU diga que a região está passando por sua pior seca em 35 anos, faz um século que os campos não ficavam tão secos na África do Sul, maior país produtor do continente, e cinco décadas na Etiópia. Isso agrava a situação em uma região do mundo onde mais de 40 por cento das pessoas vivem com US$ 1,90 ou menos por dia e estão abaixo da linha internacional da pobreza, segundo o Banco Mundial.
Mesmo que os custos globais dos alimentos monitorados pela ONU estejam atingindo a maior baixa em sete anos, pouca gente está tirando proveito disso na África Austral. A logística para enviar carregamentos de portos marítimos para os mercados interiores no Malawi e no Zimbábue aumenta o custo.
Como ocorre em muitos outros países da região, o poder de compra da África do Sul é minado pela desvalorização de sua moeda. E as economias de Angola e da Zâmbia foram atingidas pelas dificuldades enfrentadas pelos setores do petróleo e da mineração.
“A importação de alimentos para muitos desses países será muito mais custosa agora do que era há um ano”, disse Debbie Hillier, diretor de política humanitária da Oxfam International em Oxford, na Inglaterra. “Os países têm sofrido muito seriamente o declínio dos preços das commodities”.
Os custos dos alimentos poderão dobrar no Zimbábue, que precisará importar até 1 milhão de toneladas de grãos, disse Steve Wiggins, pesquisador do Overseas Development Institute, do Reino Unido.
Embora os custos dos fretes marítimos estejam baixos, o país precisa importar por meio da África do Sul e de Moçambique.
Em um ano normal de produção, o milho vendido no atacado no Zimbábue custaria cerca de US$ 120 a US$ 150 a tonelada, mas os preços provavelmente estarão pelo menos US$ 100 mais elevados neste ano com a adição dos custos de transporte, disse ele.
Para piorar as coisas, os estoques regionais já estão esgotados. A produção de grãos caiu 21 por cento no ano passado nas regiões sul e leste da África e as perspectivas para a próxima colheita, que começa em abril e maio, são “profundamente desfavoráveis”, disse a FAO em 9 de março.
A África do Sul prevê que colherá a metade do total produzido dois anos atrás e que precisará importar milho para alimentar sua população.
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