Um anúncio feito pelo presidente Nicolás Maduro voltou a chamar a atenção da imprensa internacional sobre a ocorrência de casos de nepotismo na Venezuela. “Cilia Flores vai à batalha”, declarou Maduro, referindo-se ao interesse de sua mulher de buscar uma vaga no Congresso. As candidaturas devem ser oficializadas nesta semana, e o processo eleitoral começa em dezembro.
“Aqui não tem machismo que vai limitá-la”, disse o chefe de governo, deixando claro que não tem qualquer problema com a presença de parentes próximos nas diferentes instituições do Estado.
A mesma postura está em linha com a adotada pelo ex-presidente Hugo Chávez e pelo atual presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, cuja mulher, Marlenys Contreras, foi nomeada ministra do Turismo em abril deste ano.
Os Flores e os Maduro
“Filhas, irmãos, pais, sobrinhos, cunhados e compadres das mulheres e dos militares mais poderosos do regime fizeram dos cargos públicos a folha de pagamento que sustenta famílias privilegiadas”, disse o político da oposição Claudio Fermín, um dia antes do lançamento da candidatura da primeira-dama.
Os casos de nepotismo atribuídos a Maduro e Flores, casados há quase dois anos, não são recentes. O site poderopedia.org – uma publicação que acabou se tornando referência para entender quem é quem na alta esfera política e econômica venezuelana – cita fontes que garantem que Flores influenciou no ingresso irregular de 37 familiares na folha de pagamento do Parlamento.
Isso teria ocorrido no período em que Cilia Flores foi presidente da Assembleia Nacional, entre 2006 e 2011. Ela assegura que todas essas pessoas próximas participaram de rigorosos concursos públicos.
Seu sobrinho Carlos Erick Malpica Flores – um dos nomes favorecidos com uma vaga na Assembleia Nacional – é agora diretor da Tesouraria Geral da Nação e vice-presidente de Finanças da petrolífera estatal PDVSA. O advogado Walter Gavidia, ex-marido de Flores e ex-deputado no Parlamento Latino-americano (Parlatino), preside a Missão Negra Hipólita, uma fundação que tem o objetivo de ajudar sem-teto.
O filho de Flores e Gavidia, Walter Jacob, é presidente da Fundação Pro-Patria 2000. A organização deverá construir casas populares em áreas expropriadas da empresa Polar – a maior produtora de alimentos da Venezuela. Ao contar a história, o diário argentino Clarín lembra que o filho de Flores entregaria as propriedades diretamente aos beneficiários.
Em abril deste ano, o diário espanhol El Mundodescreveu os Maduro-Flores como “a família mais poderosa da revolução”, posicionando-a acima dos parentes do ex-presidente Chávez, que ainda mantêm “uma quota importante de poder”.
A matéria sugeria que somente assim era possível explicar a ascensão de Nicolás Maduro Guerra – conhecido como Nicolas Jr. – um jovem “de currículo desconhecido”, na hierarquia estatal.
Segundo o site poderopedia.org, como diretor do Corpo de Inspetores Especiais da Presidência, o filho de Maduro assumiu a responsabilidade de avaliar o funcionamento das políticas públicas e “combater a corrupção”.
Nicolas Jr. foi responsável pela organização do festival “Suena Caracas” e coordena o projeto da Escola Nacional de Cinema, que será inaugurada em setembro.
Os Cabello e os Chávez
A família do presidente da Assebleia Nacional, Diosdado Cabello, parece seguir os passos dos parentes da companheira do presidente venezuelano. A esposa de Cabello chefia o Ministério do Turismo e seu irmão mais novo controla tanto o Ministério da Indústria como o Centro Nacional de Comércio Exterior (Cencoex).
Antes, José David Cabello foi ministro de Infraestrutura e superintendente do organismo responsável pelos controles aduaneiros e cobrança de impostos.
O irmão mais novo de Diosdado Cabello também foi diretor-geral do principal aeroporto do país e da empresa aérea nacional Conviasa. Por sua vez, Daniela, a filha de Cabello com a ministra Marlenys Contreras, aparece tantas vezes na televisão venezuelana que já é conhecida como a cantora da “revolução bolivariana”.
A morte do presidente Hugo Chávez não colocou a sua família à parte dos cargos públicos do Estado. Asdrúbal, o primo do “comandante”, é ministro do Petróleo e Minas. Adán, irmão mais velho de Chávez, é governador do estado de Bariñas. Argenis, outro irmão do ex-presidente, chefia a Direção Executiva da Magistratura, um órgão auxiliar do Supremo Tribunal de Justiça.
No entanto, as personalidades mais promissoras do clã são mais jovens: María Gabriela, considerada a filha preferida de Chavez, é embaixadora suplente da Venezuela na ONU. Ela contaria com o respaldo de um segmento do chavismo para substituir Maduro se for necessário.
Rosa Virgínia, filha mais velha do ex-presidente, estaria à sombra da irmã. Ela é presidente da Missão Milagro, uma fundação que ajuda pessoas com doenças oftalmológicas. O que Rosa Virgínia teria a seu favor é o fato de ser casada com o vice-presidente venezuelano, Jorge Arreaza.
Muitos perguntam se os servidores públicos escolhidos a dedo por seu parentesco com autoridades têm, apesar de tudo, qualificações para as funções que assumiram. Mas o problema parece um pouco mais complexo. Esses casos mostram que tanto os concursos para cargos de faixa média e alta como as avaliações do desempenho profissional dos funcionários têm pouco peso.
Tais casos parecem lembrar as práticas nepotistas dos governos social-cristãos e social-democratas anteriores ao presidente Chávez. Deixam também a impressão de que, 14 anos após o início da “revolução bolivariana”, o chavismo só fez manter uma das formas de corrupção que prometeu erradicar.
Fonte: DW
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